domingo, 10 de julho de 2011

Corrupção alimenta caixa de campanhas políticas.

O desvio do dinheiro público traz prejuízos sérios às administrações, mas também repercute nas eleições. Segundo a Procap, a corrupção banca campanhas políticas, o que expõe a fragilidade do sistema eleitoral.


Imagine um município que paga altos valores por serviço de transporte escolar que não é prestado. A empresa venceu a licitação, mas não é proprietária de qualquer veículo. O trabalho não é realizado, mas a nota fiscal é fornecida e o pagamento é efetuado.



Na prática, os veículos que executam os serviços são de pessoas da comunidade, indicadas pelo próprio gestor, que conduzem as crianças em paus-de-arara. A situação não é rara e foi constatada pela Procuradoria dos Crimes contra a Administração Pública (Procap).

Além do desvio de dinheiro público, os promotores explicam que a pessoa que faz o transporte no pau-de-arara sente gratidão pelo gestor que o indicou para fazer o serviço. Às vezes, trata-se da única renda da família. O voto é garantido. “O gestor tem, perversamente, o cabresto, porque faz da população dependente dessa renda”, diz o promotor Eloilson Augusto da Silva Landim, da Procap.

Segundo ele, são essas administrações que garantem os votos que elegem deputados e senadores. “São votos encabrestados que levam até o Senado, Câmara Federal e Assembleia Legislativa ilustres desconhecidos”, argumenta Landim.

Ele afirma ainda que essa avalanche de corrupção se dá em razão do sistema eleitoral brasileiro, no qual o candidato precisa de dinheiro para se eleger. “Aí vem a discussão do financiamento público ou não de campanha. Talvez saia mais barato. Na hora que você tem um gasto privado para que alguém se eleja, esse prejuízo vai ter que ter retorno”, defende.

Caixa dois

O promotor Ricardo Rocha explica que todo esse caixa dois vem sendo formado aos poucos. Ele cita uma operação que apreendeu cerca de R$ 3,5 milhões juntos. “Os envolvidos vão juntando para usar exatamente na campanha”. O promotor Luiz Alcântara reforça a fragilidade do sistema eleitoral. Pelas investigações que vêm sendo realizadas, ele identifica que há aumento na contratação de empresas em período pré-eleitoral. Mas isso não significa que em outros períodos eles não estejam alinhados em arrecadar recursos para as campanhas. “A mentalidade é se perpetuar o maior tempo possível. Se é possível permanecer oito anos, vai permanecer”, explica.

Nesse ponto, Alcântara questiona a vinculação política com um serviço transporte de péssima qualidade, com a formação de caixa dois, com esquema de corrupção e vai além. “Nas nossas investigações, em algumas circunstâncias, nós identificamos que essas pessoas (proprietários de empresas fraudulentas), que em alguns casos são presas, são doadoras de campanha de alguns ilustres investigados que sempre se declaram inocentes e desconhecedores dos fatos”, sustenta o promotor.

Segundo os membros da Procap, todas essas investigações podem resultar em candidaturas impedidas pela lei da Ficha Limpa, que impede o político condenado por órgãos colegiados de disputar cargos eletivos. Chefe da Controladoria Geral da União (CGU) no Ceará, Luiz Fernando Menescau de Oliveira, se diz otimista. “Nossos valores enquanto sociedade estão sendo aprimorados. A evolução ocorre num ritmo lento. Mas a lei Ficha Limpa é uma excelente novidade. Os resultados vão acontecer a longo prazo”, acredita. 


(Lucinthya Gomes - lucinthya@opovo.com.br)

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