domingo, 21 de agosto de 2011

Por que o brasileiro não se mobiliza contra a corrupção?

Os movimentos da sociedade brasileira contra a corrupção no País ainda parecem tímidos mesmo com vários casos de irregularidades nos três níveis de Governo e nos três Poderes.


Povo não é um conceito homogêneo. Há mobilizações sociais em todos os quadrantes, com maior ou menor êxito e por motivações contrastantes. Acontece que movimentos anticorrupção costumam ser, via de regra, estratégias moralistas que condenam pessoas e não moralizantes de práticas institucionais; concorrem para mascarar conflitos de interesses mais estruturais. 



Vastos setores da juventude foram bombardeados durante anos com a demonização da atividade política institucional, tratada como reduto fundamental da corrupção. 

Agora colhemos o amargo fruto disso: conivência, apatia, cinismo. O combate não se dá por razões tão nobres, não de todo, e nem sempre, mas por razões pragmático-instrumentais. E ainda assim será um bom combate quando contribuir para racionalizar estruturas institucionais e não apenas destruir pessoas. Quem disse que a luta não continua?

Sandra Helena de Souza
Prof. de Filosofia e Ética da Unifor e membro do Cons. de Leitores do O POVO


Os brasileiros estão mobilizados contra a corrupção. A lei da Ficha Limpa é um exemplo. Há um movimento crescente que está tomando conta de todo o Brasil. A rede Associação dos Amigos de Ribeirão Bonito -Instituto de Fiscalização e Controle (Amarribo/IFC) é outra prova concreta disso. É um movimento consciente, democrático, que tem feito muito pelo Brasil afora. O que tem muito desanimado os brasileiros de “engrossar” esse movimento é a certeza da impunidade que impera. Não temos visto o Poder Judiciário exercer essa sua prerrogativa. Daí fica uma sensação de que o crime compensa. A sociedade tem reagido sim.

Jovita José Rosa
Diretora da Secretaria Executiva do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral


Inconscientemente (ou não), o brasileiro simples, que compõe a grande maioria da população, se abandona na contradição entre leis e princípios, o que os sociólogos chamam de antinomia, esse vácuo entre normas morais e prática social que permite tal inércia diante da corrupção. Leis existem, mas são aplicadas? Se forem para uns, por que não são para outros? O ministro do Turismo pagou um motel com recursos públicos e continua lá. O Ricardo Teixeira disse à Revista Piauí que fazia e acontecia e continua lá. Vão se jogando panos quentes em nome da governabilidade. Se bem que Dilma anda surpreendendo e acendendo minha esperança. Sou da geração pós Ditadura Militar. Conheço de perto alguns dos que arriscaram juventude, carreiras e até suas vidas em nome da luta. A última notícia que tenho dessa vontade de participar foi no Fora Collor, quando vestiram preto, pintaram os rostos de verde amarelo e mudaram a História. Temos um novo degrau a galgar.

Ângela Marinho
Jornalista e diretora de comunicação da Agência da Boa Notícia


A resposta remeteria à própria organização estrutural brasileira. Uma sociedade cindida em classes impossibilita, a priori, que os indivíduos participem de forma efetiva dos processos políticos. Os interesses são diferentes. A falta de uma educação formal crítica para a maioria da população promove uma alienação do indivíduo sobre o seu papel no mundo. A vontade de participar é comprometida, também, pelo ritmo estabelecido nas sociedades contemporâneas em que o sujeito vive para trabalhar. Quase tudo foi tocado pela lógica industrial. O homem pós-moderno não tem o tempo livre para refletir, debater, participar e lutar por alguma causa coletiva. Impõe-se uma dificuldade, inclusive, de reconhecer e considerar o outro nas suas diferenças. Nesse contexto, a ideia de se organizar politicamente, mobilizando-se contra a corrupção, apresenta-se como algo distante do universo cotidiano das pessoas. O debate termina se concentrando no território da mídia.

Preciliana Morais
Doutora em Sociologia e professora da Universidade de Fortaleza


Procuro evitar generalizações. Existem iniciativas de movimentos organizados contra a corrupção. E, a rigor, devemos considerar que a situação não é muito diferente mesmo em países onde os desvios éticos também são disseminados. São raros os episódios, em qualquer parte do mundo, nos quais há grande reação popular à roubalheira governamental. Aliás, não só nesse campo. Há dificuldade em mobilizar pessoas para qualquer coisa; para reivindicar melhoria das políticas públicas, protestar contra precariedade na prestação de serviços ou o que quer que seja. Traço evidente do individualismo que marca as relações sociais. Além disso, é evidente que o descrédito com a política e a ideia de que todos são iguais contribuem para o sentimento de que não adianta fazer nada e de que qualquer iniciativa está fadada ao fracasso. São sentimentos que compõem nossa cultura política. Transformá-la não é tarefa simples. Mas é imprescindível.

Érico Firmo
Editor adjunto do Núcleo de Conjuntura do O POVO


O povo brasileiro tem uma longa e forte tradição de participação e mobilização para as mais diferentes questões. Pode-se citar desde a Inconfidência Mineira até as recentes mobilizações das Diretas Já, do impeachment do então presidente Fernando Collor e as recentes mobilizações pela aprovação das Leis 9840 e da Ficha Limpa. No Brasil, há pessoas organizadas em grupos de direitos humanos, comitês de acompanhamento dos orçamentos municipais e milhares de organizações sociais tendo dentro de suas pautas a luta contra a corrupção não só no mundo da política, mas em outras esferas da vida social e econômica. Todavia, a forte tradição autoritária no Brasil, com ditaduras e repressões às mobilizações sociais e o descompromisso dos grandes meios de comunicação no País, contribuem para que o número dos engajados não seja maior.

Pedro Gontijo
Secretário executivo da Comissão Brasileira Justiça e Paz, organismo vinculado à CNBB 

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