Ou o Brasil acaba com a corrupção (em todo o seu espectro), ou a corrupção acaba com o Brasil... !
"De
tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de
tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes
nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da
honra e a ter vergonha de ser honesto. " (Ruy Barbosa).
Tal
qual uma infeção generalizada que mata por falência do organismo, a
corrupção está matando nosso país. As partes ainda sã de nosso organismo
nacional não conseguem sequer enfrentar a decomposição moral, rápida e
paulatina, do Brasil. É bem este o quadro geral do doente chamado
Brasil, e esconder a gravidade desta doença só contribui para seu
alastramento. A corrupção é a doença que mais ameaça o Brasil, mais que a
Aids, que o infarto, que o câncer, que os traumas violentos. A
degradação moral já matou muitos Estados (cf. "Grandeza e Decadência
dos Romanos", de Montesquieu)
Corrupção (do Latim corruptio= alteração, movimento substancial para a destruição da substância...). Para Aristóteles corrupção é mudança que vai de algo ao não ser desse algo,
que vai da substância ao não ser da substância, que vai na direção da
especificação oposta; ou seja, mudança que nega a razão de ser de algo.
É a destruição, a dissolução, por oposição à força produtora e à
criação (cf. Metafísica). O que corrompe, destrói, provoca o não-ser do ser
corrompido. Assim, a corrupção é o mal social maior porque destrói,
anula a própria sociedade; daí sempre ter sido essencialmente um crime
em toda e qualquer civilização.
Corrupção
não é apenas a infração ao dever funcional praticada pelo agente
público (político ou administrativo). Não é só o suborno, a taxa de
urgência, o chocolate/a falsa simpatia nos balcões para obter pronto
atendimento. A corrupção exteriorizada (em ato) costuma proceder de
corrupção bem mais ampla e no mais das vezes interna (antecede o ato/a
prática). Antes de ferir o patrimônio público ou particular, a
corrupção degrada os valores íntimos de cada um, relativiza o costumes e
a cultura da virtude, anulando, pois, os pilares, os princípios
(estrelas guias da jornada humana) que mantêm a sociedade elevada e
digna de seu próprio orgulho. Tal degradação moral começa por pequenas
concessões, pequenas inversões axiológicas em nosso dia-a-dia e
prossegue corroendo o homem e sua sociedade. É, precisamente, a
tolerância de pequenos vícios, já na vida privada, que prepara a
aceitação das grandes corrupções na vida pública.
Com efeito, o estudo da república (res (coisa)+publica= coisa pública, coisa de todos) romana é bem ilustrativo : quando os interesses privados passaram a sobrepor os públicos, a decadência do Estado romano (cidade-Estado=civita) teve
início. Vale dizer, é porque perdeu-se o espírito cívico e ético que
se pode assaltar os cofres do Estado e subordiná-los a interesses
menores. Um quadro célebre de Jacques-Louis David, o pintor da Revolução
Francesa, "Os Litores levam a Brutos os corpos de seus filhos" (1789)
estampa bem a modelar república romana, vista pelos revolucionários
franceses.
O
cônsul Lúcio Bruto (não o confundamos com o matador de Cesar) mandou
executar seus filhos que conspiravam para restaurar a monarquia, na
tela percebe-se o desespero das mulheres da casa e à frente, o rosto do
cônsul demonstra todo seu sofrimento. Sofre como pai que perde os
filhos, mas sabe que a república romana exige e merece tal dor
privada...
Costuma-se dizer que a corrupção material é o recebimento de qualquer vantagem para a prática ou a omissão de ato de ofício e corrupção moral,
a que precede à material, porque é óbvio que ao receber a vantagem já
ocorreu no corrompido a deterioração de qualquer princípio de
moralidade pessoal ou funcional.
Tanto
uma como outra pode assumir forma ativa e passiva, porque também quem
oferece a vantagem indevida já não apresenta nenhum princípio moral. A
corrupção moral abrange também a corrupção de costumes, a falta de
caráter particular ou nacional, o desleixo administrativo ou
governamental, a falta de solidariedade num grupo humano, a indiferença
pela sorte alheia ou pelos interesses públicos, a tolerância
condescendente de superiores às falhas dos subalternos, filhos e
tutelados.
Há
corrupção na política, na polícia, na justiça, na administração
pública, na educação, nas diversões públicas, na família, na economia,
no Direito (a rigor no antiDireitro), nos medicamentos, nos
discursos/argumentos pseudocientíficos, nas igrejas, nas atividades
empresariais...
Na
política fala-se de compra de apoio e de voto e, as leis daí
decorrentes e impregnadas de `faz de conta' ? Na polícia a principal
corrupção é a perda da própria da razão de ser. Na Justiça, a CPI
específica já demonstrou casos pontuais, mas gravíssimos de corrupções
explicita (que ofendem a razão de ser e os Códigos legais): a corrupção
dos melhores é a pior corrupção ! Na Administração Pública em geral já
é quase crônica (inclusive na mais desenvolvida cidade do país) a
prostituição dos que ganham para defender o interesse público, por
outro lado o nepotismo é descaradamente explicado, jamais justificado..
Na educação já é quase cultural a deturpação da aprovação garantida em
troca da simpática receptividade da `galera'; o mérito intelectual
cedeu lugar a quase tudo, inclusive ao `mérito' `do politicamente'
`correto' (esperteza `política' ou mercantil na escola ! ); aqui retomo
um conceito que usei há anos ao tratar da crise do ensino jurídico, ou
seja, o de "pacto da mediocridade" que bem sintetiza esta corrupção "consentida" e que nos remete à Nietzche: "
A mais comum forma de estupidez humana é esquecer o que a gente está tentando fazer".
Há corrupção nas diversões quando baixa-se o nível cultural para se
alcançar a maior audiência.... Há corrupção em certas estatísticas, nos
discursos em geral, nas promessas, nas propagandas (inclusive as
governamentais) quando promessas vazias, quando lastreadas em reserva
mental (sabe-se de antemão da mentira anunciada/prometida).
Na
família o exemplo "edificante" tem sido o de que os meios justificam
os fins, é melhor ter do que ser; o honesto por princípio, já tem forte
concorrente : o honesto que convém aos ganhos.Na economia, a
corrupção, dentre outras, é por conta da imunidade (ou impunidade
sonegatória) da fortuna, enquanto o salário paga (sequer tem a mesma
chance de sonegar) e não pouco ao Estado. No Direito, deturpa-se
teorias e teleologias para agasalhar interesses inconfessáveis (vide a
falência da falência, do processo de execução, sempre menos favorável
ao pobre que ao rico, tudo com ares de justiça e boa técnica
jurídica).
Há,
ainda, a corrupção argumentativa, por exemplo, sobre a globalização
(globaliza-se o interesse do 1º mundo em detrimento da economia e do
povo do resto do mundo). Corrompe-se até a fé : grandes milagres, só
com grandes dízimos.
Há
corrupção, quando grandes empresário usam a Justiça e o Direito para
fugirem aos seus deveres sociais e às condenações judiciais (poucos
pagam seus débitos judiciais sem tripudiar sobre a dignidade da
Justiça).Há corrupção quando advogados se apequenam em subserviência
geral aos que lhe devem prestar o serviço público por dever funcional.
Conseguimos
ignorar a alastrada corrupção de nossa língua pátria, aceitando
infantilmente o colonialismo anglo-americano (mais americano que anglo)
e o que é pior, esta violência ocorre menos pela forca da metrópole e
mais por "chique" inversão (p. ex : finais por "play off ... " ), tal nossa fraqueza cultural.
Nossa
corrupção é mais grave que a dos demais povos porque em alta taxa e
porque já dominou partes do sistema defensivo, já corroeu os
princípios, baluartes do sistema de defesa, já depauperou a crença nos
remédios e na esperança de dias melhores para quem não aderiu ao vale
tudo moral. O relativismo moral, a moralidade light (a corrupçãozinha diária do `deixar pra lá...') já é a corrupção primaria, que já devia levantar a indignação social.
Por
que será tão difícil a penalização exemplar de nossos corruptos
assumidos e identificados, antes ao contrário, são eles `colunáveis' e
até benquistos na comunidades doente. Os valores morais (impessoais e
supra ordenados) devem valer, contra todos, por si mesmos, independente
da pragmáticas adotadas. Nenhum outro interesse pode afastar o valor
moral da ação humana, este é o ponto que dignifica e distingue o homem
do animal.
Na
dúvida acerca do valor moral a orientar a ação, cabe-nos indagar sobre
os fins desta ação e aí saberemos o que é mais eticamente relevante e o
que menos nega a razão de ser desta própria ação.Sucede que, amiúde, a
tão-só explicação da ação não basta, ela há sobretudo de ser
justificada, ou seja, eticamente consistente.
O doente "Brasil" precisa e com urgência
de UTI, de um programa de tratamento asséptico, do tipo tolerância
zero, contra a infecciosa corrupção, não importando de que tamanho ou
de que potencial maligno.Toda corrupção, todo desvio moral será alvo da
mais firme e suasória reprimenda, já nos meios de comunicação social
(depuração ética na programação diária), já na ação política
(macroética) e até na responsabilidade sócio-política dos pais de
família (microética); enfim tudo e todos devem ser convocados para
salvar da morte, por traumatismo moral, o Brasil.
Quanto
mais cedo começarmos mais depressa debelaremos o mal. Não podemos
continuar sendo uma grande pizza da qual cada um tira um ou mais
pedaços. Um novo projeto de educação, de civilidade, uma nova escola (a
paideia e a arete dos gregos clássicos são conceitos que
merecem ser revisitados). Não podemos mais continuar impassíveis
diante do triunfar de tanta e de tão variada gama de corrupção (negação
da razão de ser), nossa identidade enquanto nação exige que
revertamos o quadro atual que faz muitos terem vergonha da honestidade,
estimula a devassidão e a falta de virtude por princípio, Ruy Barbosa
já no inicio do século, advertia o Brasil para este mal nacional.
Ou o Brasil acaba com a corrupção (em todo o seu espectro), ou a corrupção acaba com o Brasil... !
Por outro lado, a eticidade por
princípio, que há anos defendemos, deve passar longe do risco do
moralismo farisaico, do cinismo do discurso ético (utilitarismo ético)
sem a respectiva prática diária. Todavia por recearmos a corrupção
desta prática da ética, não podemos admitir a corrupção inversa da
ética alguma. (por temor ao nacionalismo, caímos no desprezo absoluto
pelo sentimento de nacionalidade, salvo em época de Copa do Mundo). Já
estamos nos dissolvendo enquanto nação.
Já
vendemos e perdemos muito de nós. Conseguimos dissolver o nosso sádio
orgulho patriótico, o sentimento de brasilidade (hoje há até
vergonha/desdém de ser patriota, há uma inabilidade sentimental com os
nossos símbolos nacionais). Por ora, já estamos nos desfazendo do nosso
patrimônio empresarial. Dizia-se sobre Roma decadente: "em Roma tudo
está a venda" (Salustio 86/35 aC).
Manter o Brasil e tê-lo para os brasileiros (manter, manu+tener=ter
nas mãos) vai ficando cada vez mais longe de nós. Só falta mesmo a
cessão, em comodato, do povo brasileiro por algumas gerações, como mão
de obra barata. Depois disto o brasil será mero objeto da história: uma
terra que em se plantando tudo daria; um país abençoado por Deus,...
Há, por fim, corrupção no caráter, na personalidade de quem nada faz
contra tal doença letal ao país.
Brecht tinha razão: o
analfabeto político é o pior de todos, pois não sabe que de sua
ignorância ou omissão nascem o corrupto e o mal de sua vida privada.
Disse, certa vez, Abrão Lincoln acerca da essencial moralidade do
advogado (mais extensíveis a todos) : "Se no seu próprio
sentir, não puder ser advogado honesto, decida ser honesto sem ser
advogado. Exerça outra ocupação, melhor do que aquela, em cuja escolha,
de antemão, consente ser um velhaco." Ainda há tempo: não sejamos velhacos !!
Brasileiros uni-vos contra a dissolução do Brasil ! Eis o pacto que precisamos, todos, empreender.
Luiz O. Amaral
Nenhum comentário:
Postar um comentário